Ano: 2012
Diretor: Tsutomu Mizushima (“Another”, “Blood-C”, “XXX Holic”, “Yondemasu yo, Azazel-san”)
Estúdio: J.C Staff
Episódios: 13
Gênero: Comédia / Slice-of-Life
De onde saiu: Mangá, 4 volumes, em andamento.
Diretor: Tsutomu Mizushima (“Another”, “Blood-C”, “XXX Holic”, “Yondemasu yo, Azazel-san”)
Estúdio: J.C Staff
Episódios: 13
Gênero: Comédia / Slice-of-Life
De onde saiu: Mangá, 4 volumes, em andamento.
*****
Presente na cultura japonesa
há pelo menos dois séculos, o “rakugo” (literalmente,
“palavras caídas”) é uma espécie de apresentação japonesa com monólogos
humorísticos, onde
uma pessoa sentada em um tatame sobre o palco, tendo apenas um leque nas mãos,
conta uma história. As narrações sempre possuem duas ou mais personagens e
consiste somente de longos diálogos entre elas, e o humorista se aproveita de
tons de voz distintos e gestos para chamar a atenção da plateia. Por fim,
enquanto o “rakugo” original termina suas histórias abruptamente, usando alguma
frase inesperada e cômica (conhecida por “ochi”), com o tempo foram surgindo
outras variações que se afastam, cada um à sua maneira, um pouco desse padrão,
tendo inclusive certos estilos que não usam tal truque em seu desfecho.
Essa introdução didática se
deve ao cenário em que se passa “Joshiraku”, anime “slice-of-life” de paródia
(mais um a dar as caras no blog, e certamente não será o último...) e sátira
exibido nesse ano. Nele,
durante a maior parte do tempo, vemos cinco garotas bonitinhas conversando
sobre tudo e nada no camarim do teatro de “rakugo” em que se apresentam, e
geralmente seus diálogos chegam a conclusões distantes, distantes demais do
ponto inicial. Antes
de começar a falar do anime em si, vale tocar em algo que pode causar certa
estranheza no início: se nomes como Tetora Bouhatei, Kigurumi
Haroukitei ou Gankyou
Kuurubyuutei fogem do comum,
isso é porque estes são pequenos jogos de palavras que fazem alusão à
personalidade ou aparência de cada uma; mas, para quem conhece “Sayonara
Zetsubou Sensei” (obra do mesmo criador, Kumeta Kouji),
isso nem será novidade, visto que esse anime também usa tal artifício em suas
personagens, cujos nomes resumem seus comportamentos. Ademais, como
curiosidade, o termo “tei” com o qual termina o nome de todas as meninas é
frequentemente usado em apelidos de palco por atores.
Fora isso, se prepare, pois
de trocadilhos “Joshiraku” está repleto, para a angústia de tradutores e
decepção de quem não sabe japonês, e isso nem chegará a ser o maior “problema”
para nós do ocidente.
Obviamente, “Joshiraku” é uma
versão mais light e inferior de “Sayonara Zetsubou Sensei”, anime de humor
adulto, negro e maldoso cujo mangá rendeu trinta volumes; mas, apesar disso, a
veia ácida de Kumeta Kouji segue intacta e suas
garotinhas moe tão falsamente inofensivas são capazes de falar – e falar mal –
a respeito de política, religião e celebridades com tremenda cara de pau e
tranquilidade, uma conduta que gerou um número razoável de reclamações e
censuras – afinal, mencionar, por exemplo, fatos ligados ao terremoto de 2011 ainda parece ser um tabu por lá,
principalmente se você faz isso com menininhas de rostos alegres e sorridentes.
Porém, além de continuar com suas eternas críticas sociais, Kumeta também não
deixa de dar alfinetadas ao ramo em que trabalha e à própria ferramenta que usa
para dialogar com o público, o moe: constantemente
fazendo piada de si mesmo (coitadinho, foi produzido pela J.C. Staff, não dá
para competir com certa Kyoto e suas garotas que tocam instrumentos...) e de outras obras que usam isso,
“Joshiraku” exibe uma grande sinceridade e mostra absoluta consciência de suas
ações, tendo assim uma relação aberta e franca com o espectador. Você sabe que
às vezes estão falando mal justamente daqueles que veem o anime, e que tiram
sarro ao mesmo tempo em que passam a mão em sua cabeça e agradecem pelo apoio;
entretanto, elas são tão lindinhas, engraçadinhas e honestas, que dá para
relevar... Esse moe maldito...
Você apenas deveria ler o mangá,
pois não há razão de ver um anime com pouca ação que se baseia somente em
conversas num cômodo. Se
bem que os produtores estão fazendo o que podem para levar adiante tal
adaptação, mesmo que haja tão pouco para animar, e mesmo que, no fim, a maioria
vá assistir isso de graça... Esse é um resumo das primeiras linhas do primeiro
episódio, uma quebra da quarta barreira instantânea e autocrítica. Após isso,
uma discussão em volta de como se vestir para uma festa passa por desde
fanservice assumido a uma apresentação curiosa do nome de cada personagem, e,
quando se percebe, o tópico inicial de tudo já ficou esquecido lá atrás.
“Joshiraku” segue uma montagem semelhante à feita pela SHAFT em “Sayonara
Zetsubou Sensei” a partir da segunda temporada, em que cada episódio é dividido
em três partes. O primeiro e o terceiro, sempre, se passarão no camarim do
teatro de “rakugo”, e o segundo é o que causa mais “dropagens” (é sério, li
muitos relatos a respeito) por parte dos espectadores do ocidente, porque aqui as
meninas passeiam por diversos pontos do país num clima bastante turístico. Pode
ser enriquecedor e sedutor para aqueles curiosos em saber mais sobre a cultura
do Japão, mas por outro lado esses trechos podem também se transformar
facilmente em uma experiência cansativa, e não só por conta da profusão de
alusões a acontecimentos, estabelecimentos e personalidades locais que mal
conhecemos, mas inclusive pelos inúmeros trocadilhos existentes, que têm uma
presença maior aqui. É, em suma, a junção dos dois maiores obstáculos da série
para nós, essa carga tão japonesa que, por morarmos em outro país e não sermos
fluentes na língua, nos faz perder muito da comédia satírica e – geralmente -
inteligente que “Joshiraku” oferece.
Todo episódio se inicia com
uma das garotas se apresentando no teatro, e nem perca tempo tentando achar
graça nas histórias. Pois, primeiro, elas são iniciantes, e suas narrações não
são mesmo tão boas; e
segundo, porque, como o humor se encontra em jogos de palavras, este perde todo
o sentido no processo de tradução, restando somente um relato que, pode ser
qualquer coisa, mas não engraçado. De igual forma, esses
trocadilhos são uma constante nas conversas das personagens, que praticam toda
hora brincadeiras com caracteres, dialetos, mudanças de provérbios e
associações de palavras a fatos reais, pessoas ou cultura nerd em geral,
abusando nisso de homônimos e não raramente desrespeitando totalmente as normas
gramaticais da língua, o que torna impossível de retransmitir em outro idioma até
sentenças inteiras em alguns casos. É verdade que várias séries (principalmente
as de “slice-of-life” com garotinhas) adoram se utilizar do complexo
vocabulário japonês para criar essas situações, mas “Joshiraku” apresenta um
nível que fica exageradamente acima do normal, que nem mesmo “Sayonara Zetsubou
Sensei” se equipara – pois tem muito disso nele. Não dá para ignorar que muitas
dessas piadas são horríveis e forçadas, involuntariamente cômicas de tão ruins;
mas não raramente uma historinha ou diálogo inteiro se torna incompreensível e
tedioso por se valer tanto desse artifício. Em casos isolados, a simplicidade
dos jogos de palavras ajuda para que acompanhemos essas brincadeiras, mas será
mais comum nos depararmos com linhas
inteiras de conversa que passarão batidas por soarem tão estranhas e bobas -
ainda que, por trás delas, esteja escondida uma irônica e mordaz citação aos
impasses políticos com países vizinhos ou ao escândalo recente de uma
sub-celebridade envolvendo bebidas ou drogas, o que esbarra no outro
componente importante para a comédia de “Joshiraku”, a informação externa.
Se não estiver tratando de temas universais como religião ou
comportamento humano - sem se preocupar em não ofender -, de vez em quando o
anime exigirá de ti um conhecimento até que geral sobre atualidades - que nem
no episódio um, por exemplo, onde as protagonistas tem a ideia de gritar
“Devolvam!” para o mar e assim se seguem cutucadas para todos os cantos do globo, de “Devolvam nossas
terras” em direção, possivelmente, à Rússia (pois há tempo os dois países
disputam o direito de posse de algumas ilhas) a “Devolvam nosso povo” à China,
“nossa tecnologia” à Coreia do Sul e por aí vai. Umas
indiretas bem diretas aos americanos aqui - não poderia faltar, lógico -,
outras aos coreanos ali, aos chineses... Se eventos assim já parecem
complicados, a situação piora nos momentos em que “Joshiraku” olha para seu
próprio umbigo e desfia dezenas de referências a fatos ou locais que não são de
consciência geral. Sátiras voltadas às decisões tomadas pelos primeiros ministros (cargo que no Japão está passando rapidamente de mão em mão nos
últimos anos) e outros políticos, reclamações veladas às medidas do governo
criadas para tentar abafar a crise econômica e sarcasmo em relação à vida de
famosos e pseudo-famosos são recorrentes - sem contar os inevitáveis e vários diálogos em volta de
produtos, programas, estabelecimentos e pontos conhecidos do país,
principalmente nas historinhas do meio de cada episódio no caso deste último. E
“Joshiraku” exibe uma impressionante fidelidade nessas horas, não apenas pela
descrição detalhada das personagens, quase que como se fossem belas guias,
desses lugares, como inclusive pela retratação minuciosa por parte da animação
– Akihabara, Roppongi e
vários outros distritos comerciais são alguns dos pontos visitados. É um anime
promovendo o turismo sem esconder isso, uma prática comum recentemente – vide “Hanasaku
Iroha”, “Rinne
no Lagrange”,
“Ano Natsu de Matteru”...
E, se esses trechos “hoje vamos conhecer este lugar” não
interferem tanto na comédia do anime (ou você simplesmente acha interessante e
aprende um pouco da cultura de outro país, ou acha chato e torce para que a
“excursão” acabe logo), a falta de informação em relação ao que se passa no
Japão – ou, melhor dizendo, o fato de você não ser um japonês que vê
diariamente noticiários e programas japoneses – acaba refletindo nas piadas, e
infelizmente é muito frequente várias delas se tornarem sem sentido e bestas,
tais quais as de trocadilhos, por conta de não sabermos o contexto e o
significado por trás delas. Vale ressaltar que “Sayonara Zetsubou Sensei”,
excluindo isso de passeios didáticos, não foge em quase nada do que está sendo
dito nesta resenha; mas nele Kumeta Kouji não exagerou tanto quanto a criar uma
obra tão limitada de público que nem fez em “Joshiraku”, especialmente porque
dá foco a um tópico universal, que é o comportamento humano individual e
coletivo - mesmo que o japonês em particular -, deixando em segundo plano
citações internas. Algo que “Joshiraku” também pratica, em menor intensidade; e
isso, junto às incontáveis paródias a outras animações e o visual e trejeitos
das garotinhas, é o que nos resta para conseguirmos nos apegar ao anime, e
amenizar desse jeito a questão de não termos nascido na mesma terra que eles.
Você poderá perder e não entender muita coisa em “Joshiraku”, mas mesmo que isso ocorra terá ainda diversas partes excelentes – e outras nem tanto, de vez em quando as piadas são infelizes mesmo, acontece - que não são prejudicadas pelos problemas citados acima simplesmente porque, muitas vezes, o que se vê é apenas um humor “nonsense” e espontâneo, que não se baseia demais nos hábitos e dia a dia dos japoneses para fazer rir. Histórias como quando as garotas ficam desconfiadas entre si achando que uma delas ganhou na loteria, ou quando discutem sobre a ideia de que, em certos casos, fazer algo somente uma vez já é o bastante não deixam de possuir muito dos costumes orientais no meio; mas a comédia é direta, é visual, de fácil compreensão e entendimento, e dessa forma, pelo menos aqui, o anime pode ser apreciado normalmente. E, enquanto a protagonista Marii – a de cabelos vermelhos – e suas amigas ficam em bate-papos aleatórios que fluem com considerável naturalidade e que ignora a quarta barreira, se tem no meio paródias a animes de todos os gêneros e épocas, e é óbvio que “slice-of-life” de garotinhas são os mais lembrados - nem é preciso dizer que "K-ON!" é alvo de bullying (ou inveja?) a todo instante, não é? De animações clássicas jamais esquecidas como "Hokuto no Ken", "Detective Conan", "Doraemon" e "Lupin" a séries recém-acabadas neste ano ou anos atrás ou que estão ainda em andamento como "Toradora!", "The Idom@ster", "Another", "Shirokuma Cafe" e "Bakuman" (a lista é extensa, ultrapassa mais de 60 títulos), "Joshiraku" se lembra delas através de cenas rápidas e por diversos métodos, ora ironizando, ridicularizando, citando aberta ou timidamente no meio de uma conversa de maneira frequentemente forçada ou, apenas, fazendo aparecer no fundo alguma alusão qualquer – principalmente com os que são produções da J.C. Staff nesse último, pois fazer autopropaganda nunca é demais e assim você não precisa censurar nomes nem imagens. Um fã de animes mediano, seja ele de produções mais velhas ou não, dificilmente encontrará dificuldades em reconhecer e compreender um bom pedaço dessas referências. Filmes de várias nacionalidades, jogos e doramas são outros alvos preferidos da animação.
E é previsível, esperado, mas
a obra máxima de Kumeta Kouji feita pela SHAFT não deixa de ser lembrada quase
que todo episódio, implícita ou explicitamente – um desenho em uma camisa, uma
aparição relâmpago de um dos vários personagens do anime, uma crítica quanto ao
seu conteúdo... É o professor desesperado e suas alunas tomando de seu próprio
veneno, e na forma de lindas garotas. E elas, aliás, só são lindinhas porque
Kumeta – que, digamos, não é lá muito bom com traços delicados – não foi dessa
vez responsável pelo “character design”, feito aqui por Yasu no mangá - Masayoshi Tanaka ("character designer" de
séries como "Highschool of the Dead, "Ano Hana" e "Ano
Natsu de Matteru") foi o
encarregado da adaptação para o anime. Yasu também é o criador original do
“character design” de “Toradora!”, e na próxima temporada fará o mesmo em “Mangirl”,
anime que terá meninas fofas publicando uma revista de mangás. Um especialista
em moe, que é o que o anime tem de melhor a oferecer em se tratando de
animação.
Mesmo que “Joshiraku” sempre que possível lamente suas condições
precárias (foram produzidas por este estúdio ao invés daquele, serão
rapidamente esquecidas, sofrem injustas censuras, têm baixo orçamento, passam
em um canal menos popular etc), a J.C.
Staff realizou um trabalho até que satisfatório para um anime desse gênero –
afinal, Kyoto Animation é outra história. Não há como não imaginar como seria
este anime caso a SHAFT estivesse no comando, que nem ocorreu com as outras
adaptações das obras de Kumeta - "Sayonara Zetsubou Sensei" e "Katte ni Kaizou"
-; e é verdade que, nos momentos em que piadas e longos diálogos não funcionam
por serem meramente ruins e idiotas, sente-se falta de uma arte audiovisual
requintada e bizarra para disfarçar tais deslizes - pois a SHAFT sabe fazer
isso muito bem, deve-se admitir. Mas, tentando ser defensor da J..C. Staff ao
mesmo tempo em que a critico, seus cenários tão insípidos e pobres e a falta de
movimentos realçam o moe das jovens atrizes de "rakugo", que
certamente se perderiam naquele carnaval de cores de Akiyuki Shinbo.
De rostinhos suaves com risquinhos rosados, além de cabelos e olhos de
cores iguais, o “character design” criado por Yasu e redesenhado por Masayoshi
justifica uma frase tão repetida no início da série: “Este
anime é repleto de diálogos ordinários para que assim os espectadores possam
apreciar plenamente o quão bonitas são as garotas”. E o pior é que isso dá certo quando a conversa é de fato banal
e tediosa ou incompreensível para nós, ainda que “Joshiraku” esteja com isso
tirando sarro dessa ferramenta. E, se durante esta longa resenha (a maior que
já fiz, e não esperava que fosse para um anime desses) não reservei espaço para
destacar melhor estas meninas, não nego, adoráveis, é porque Kumeta cria mais
uma vez um bando de personagens bastante ordinárias individualmente, que só
funcionam em conjunto e que não passam de piadas ambulantes de arquétipos (a
fofinha por fora e malvada por dentro, a nerd de óculos, a comum...) usadas para
criticar e satirizar tudo que for possível. São uma graça, são bonitinhas como
devem ser, e é quase certo que você terá sua favorita (escolho a Kukuru!); mas,
ah, ao contrário de outros animes do tipo, o conteúdo por trás delas muitas vezes é bem mais interessante do
que elas em si, pois não se trata unicamente de conversas sobre dever de casa e
comida.
“Joshiraku” exige paciência e uma carga de conhecimento nipônico
muito acima da média para ser desfrutado plenamente, e esteja ciente de que
surgirão inúmeras partes que causarão certo aborrecimento, por percebemos que
aquela frase ou cena deve ser mais engraçada e inteligente do que realmente
parece na legenda. E, nessas horas, não adianta colocar a culpa no tradutor ou
pensar que o humor do anime que é de gosto duvidoso (mesmo sendo em alguns
instantes); você está diante de um anime extremamente japonês – estranho dizer isso, não? – que o
fará perceber a real distância entre línguas e culturas tão diversas. Desse jeito, aí que não dá mesmo para competir em popularidade
com meninas que tocam música e viajam para a Inglaterra...
**********
Nota: 7,5
...
Meu perfil no MyAnimeList, com indicações semanais de matérias diversas sobre o mundo otaku feitas por este e outros sites;
http://myanimelist.net/profile/DarDrak
Ta ai um anime que mal entendi as piadas, só que até onde assisti vi com um sorriso enorme. haha
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