8 de outubro de 2012

Resenha: La Storia Della Arcana Famiglia



“Arcana Famiglia” é só mais uma adaptação comum de um “otome game”, e desavisados sairão frustrados caso se deixem levar pelo conteúdo de sinopses

Ano: 2012
Estúdio: J.C. Staff
Episódios: 12
Gênero: Comédia, Drama, Romance
De onde saiu: Visual novel para PSP.



*****


Com uma introdução tola e forçada, mas competente quanto a expor sem rodeios o mundo em que se passa a trama do anime, o primeiro episódio de “Arcana Famiglia” apresenta os principais membros da “família” Arcana, uma organização que protege e cuida da pequena ilha de Regalo com a ajuda de poderes místicos derivados de cartas do tarô. Junto a isso, não demora a ser revelado que o atual líder da família, Mondo, pretende escolher seu sucessor, e de uma maneira um tanto inusitada; dessa forma surge o "Arcana Duello", torneio cujo vencedor não só se tornará o novo chefe da organização, como também terá a oportunidade de se casar com a filha de Mondo, Felicità, de apenas dezesseis anos.

Entretanto, Felicità bate contra a decisão do pai, e após uma discussão fica resolvido que ela terá de vencer o Arcana Duello caso não queira se casar. Além disso, dois jovens membros da família, Nova e Libertà, mostram-se interessados em ajudar a garota a retomar sua liberdade, prometendo ganharem o torneio sem, contudo, obriga-la a se tornar sua esposa. Juntos, os três têm poucas semanas pela frente antes do início da disputa, e precisarão usar esse tempo tanto para conhecerem um ao outro, quanto para aprenderem a usar melhor seus poderes.


E, assim, “Arcana Famiglia” conseguiu criar expectativas erradas em quem ignorava a sua origem – sendo que, mesmo aqueles que sabiam se tratar da adaptação de um jogo feminino esperavam algo diferente do que é geralmente visto nessas produções, e o primeiro episódio auxiliou bastante em aumentar tal ilusão. A partir do segundo episódio, contudo, o anime mostra o seu verdadeiro material: uma história cotidiana que foca precisamente nas relações de Felicità com dois integrantes (duas rotas do jogo) de seu harém, Nova e Libertà. Lutas, ação, ritmo frenético? Não, não, não - na verdade sim, para ser exato, mas em situações bem isoladas e em cenas nada empolgantes.

Felicità no começo até esboça a ideia de que será uma heroína fora dos padrões, enérgica, decidida, nada bobinha ou apática; mas rapidamente percebemos que, pois é, como toda protagonista de visual novels desse tipo, ela está longe de ser a personagem de maior desenvolvimento da trama – vinda de uma obra voltada às mulheres, ela não deve se destacar mais do que os belos rapazes que a rodeiam. Estes, por outro lado, desde os primeiros segundos do anime assumem abertamente suas personalidades genéricas, do bonitinho delicado e ingênuo ao “bad boy” misterioso de poucas palavras, tendo como principais o alegre burrinho de passado violento – Libertà -, e o reservado antissocial – Nova - (que, segundo os moldes criados sabe-se lá quando ou por quem para esses games, deve quase sempre ter cabelo azul curto e carregar problemas familiares). O comparando com outros animes que saíram da mesma fonte recentemente, “Arcana Famiglia” tem a seu favor o fato de sabiamente não ter tentado dar importância e espaço aos dramas pessoais de todos os integrantes do harém, visto que tal abordagem poderia ser desastrosa para uma série de 12 episódios - “Uta no Prince-sama” em 2011 cometeu tal abuso, narrando seis histórias de seis rapazes em 13 capítulos, e o resultado disso foi horroroso (não financeiramente, já que o anime vendeu muito e uma segunda temporada está por vir). Porém, “Arcana Famiglia” se torna, mesmo dentro de seu gênero e considerando seu público alvo, em um anime fraco e ordinário, cujo ritmo letárgico e a preguiça e falta de atrativos no enredo muito testam a paciência do espectador em aturar a animação até seu final.



Na maior parte de sua duração o anime se aproveita de eventos ingênuos não tão convincentes para fazer com que Felicità se torne mais íntima dos garotos, e assim se crie um triângulo amoroso instável que teima em existir (Nova e Libertà têm mais química entre si do que com a garota...), além de descobrir aos poucos fatos do passado de cada um – e, como consequência, eles teoricamente vão ficando mais bem preparados para o dito Arcana Duello, aprendendo a controlar seus poderes e emoções. Um evento beneficente organizado pela família (pois a máfia aqui é totalmente honesta e bondosa) insere fragmentos do drama de Libertà, e no episódio seguinte um incidente faz Felicità ficar a par dos sofrimentos que ele passou quando criança; adiante, o mesmo ocorre com Nova. E, obviamente, procedimento igual segue entre os dois rapazes, quando, entre outras situações, eles ficam um dia inteiro presos um ao outro por uma algema, o que os obriga a se socializarem e unirem suas forças – sim, sim, uma criatividade imensurável, e tudo isso narrado de um modo desinteressante e incrivelmente insosso. O fato é que isso funciona na questão de revelar e desenvolver lentamente as subtramas, enquanto a trama central evolui de maneira praticamente imperceptível ao mesmo tempo – especialmente para quem aguarda por algo que provavelmente nem irá acontecer.


Creio que o último parágrafo deixou claro como “Arcana Famiglia” não se esforça tanto para ter um enredo minimamente inventivo; culpa do material raso da tediosa obra original, pois o anime é fiel o quanto é possível ao seu conteúdo (ironicamente, esse pode ser visto como seu principal “erro”). Apesar de tentarem fazer com que seja sensível o progresso – se bem que às vezes há alguns retrocessos, e em outras empurram isso com certos diálogos e acontecimentos afetadíssimos, destinados unicamente a arrancar suspiros femininos – da relação do trio protagonista por meio dos fatos que ocorrem, tudo na realidade permanece revestido com uma falsidade e mesmice imensas; não importa o que façam, Nova ainda é um personagem que parece sempre emburrado com alguma coisa e Libertà não deixa de ser um bobalhão alegre e barulhento, isso sem falar de seus companheiros que, diferente desses dois, mal tem espaço para fingir que mudam ou mostrar que possuem mais do que frases e ações mecânicas e rostinhos bonitos. Felicità, por sua vez, vai se tornando cada vez mais uma menina débil típica do gênero, na qual seu maior feito é talvez sair por aí fazendo perguntas pessoais a todo mundo – intrometida! -, e lutando de vez em quando contra ladrões sem cérebro para passar a impressão de que não é uma mocinha delicada e passiva qualquer – pelo menos, não se transforma numa daquelas que cai direto em armadilhas e precisa ser salva a cada episódio. No final, homens e mulheres poderão se interessar antes pelos populares seiyuus e o “character design” chamativo dos personagens femininos e masculinos do que por suas personalidades frias, porque - outro ponto a favor da J.C. Staff – o anime exibe um trabalho competente e atraente nesses quesitos – e no caso da arte tinha de ser assim, visto que falamos de algo saído de uma visual novel, que tem suas animações como principal apelo para atrair consumidores.



O “character design” estilizado de traços bem reconhecíveis, delineados e de tons fortes, e a ambientação elegante de um possível território italiano (com um sofrível sotaque por parte dos personagens) no início do século XX ostentam uma qualidade não tão surpreendente, mas acima da média e que tem se tornado comum nessas adaptações – no máximo, há um abuso de cenas estáticas e repetidas. Porém, o que mais evidencia o empenho especial da J.C. Staff na produção de “Arcana Famiglia” é a relação de seiyuus masculinos, em sua maioria nomes famosos que fazem sucesso com as mulheres. Fukuyama Jun (Libertà), talvez, é o mais queridinho hoje, mas Tomokazu Sugita (“Suzumiya Haruhi no Yuutsu”, “Gintama”) e Yuuichi Nakamura (“Clannad”, “Fairy Tail”) vêm logo atrás e só eles na série já é um indício claro de quem é o público alvo - esses três inclusive estão no elenco de “K”, animação original cheia de mistérios em volta que parece ser direcionada ao público feminino (enquanto esse texto era escrito ela ainda não havia estreado). Menos populares, Kouji Yusa e Hiroyuki Yoshino completam o grupo de “galãs” de “Arcana Famiglia” – e, não sendo um modelo de beleza, mas nem por isso menos conhecido, há por fim Fumihiko Tachiki, que entre tantos papéis na carreira dublou o emblemático Ikari Gendou de “Neon Genesis Evangelion” e Zaraki Kenpanchi de “Bleach”, sem contar suas investidas na pele de narrador em várias séries, como o inesquecível (e mala?) de “Kaiji”, por exemplo. Dublando Felicità, a voz suave de Mamiko Noto (“School Rumble”, “Jigoku Shoujo”) é a única feminina de destaque, e ela dá à garota aquele toque frágil necessário para tal heroína. Enquanto isso, o tratamento conferido à animação e o elenco de seiyuus não é o mesmo dado para a trilha sonora, possuindo esta duas músicas de abertura e encerramento sonolentas e toques instrumentais de inspiração europeia tão marcantes quanto as personalidades dos personagens do anime.


Em seu final - sendo mais exato, em seu último terço -, “Arcana Famiglia” joga as cartas na mesa e tira de vez qualquer dúvida que possa ainda ter ficado a respeito de seu enredo: o desapontamento só não é maior para o espectador porque este, se chegou a esse ponto, deve ser porque ser conformou em ver simplesmente a história de três jovens se apoiando e superando suas fraquezas – quem erroneamente esperava apenas por uma obra movimentada com lutas “abandonou o barco” muito tempo atrás, ao se deparar com resgates de gatinhos e eventos beneficentes. Por mais miserável e questionável que seja o teor de sua história, a série pelo menos tem a decência de concluí-la; contudo, o episódio final falha ao apresentar de forma corrida e mal feita aquilo que era tão aguardado desde o começo, além de se acovardar no desfecho das principais complicações da trama, complicações essas que possivelmente eram o que animava a maioria em continuar a ver o anime. “Arcana Famiglia”, a despeito do enganoso primeiro episódio, se faz explícito quanto a com quem ele quer dialogar e de quem quer chamar a atenção: e para estas verem, em um anime visualmente apelativo, jovens galantes e pomposos se curvarem e fazerem de tudo em prol da amada é mais que o suficiente – como isso irá acontecer fica em segundo plano.


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Nota: 4


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